sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Brasilianas - Cantos de Trabalho (1955)


Cantos de Trabalho
abre com um texto introdutório, onde diz que “canto de trabalho é música para suavizar e alegrar as tarefas braçais. As cantigas de trabalho, inspiradas na própria tarefa, existem em todo o Brasil, e nelas se encontram muitos dos mais belos fragmentos do folclore brasileiro”. Percebe-se novamente a intenção de destacar o país. É um costume estritamente brasileiro, que faz parte da brasilidade. Aqui, Mauro resume exatamente qual o sentimento que se terá ao final dos pequenos trechos que formam este filme: o trabalho braçal é árduo, mas a música suaviza, poetiza o suor dos que trabalham.
É assim que somos introduzidos ao primeiro canto, onde a mulher, ao socar o pilão, entoa “tanta gente pra ‘comê’ e eu só pra ‘socá’”. O trabalho repetitivo e o ritmo das batidas no pilão entram em consonância com a música, tornando tudo uma única coisa. É como se um dependesse do outro e de tudo isso, os pratos suculentos que sucedem do trabalho e que finalizam o trecho. Comidas tipicamente brasileiras, como aquelas pessoas que as fizeram. Quando homens, com os mesmos movimentos, utilizando um socador, agora firmando a terra onde pisam cantam “e bate o pilão, arueira”, o ritmo também se impõe aos trabalhadores e o sol quente que da pele deles faz escorrer o suor não parece tão forte quanto os homens que, filmados em planos próximos e em contra-plongée, se agigantam e, como em poucos momentos nas Brasilianas, tem rosto, tem identidade.
Na cantiga do barqueiro, que atravessa solitário o rio dentro de sua canoa furada, ele não só encontra as dificuldades que a própria atividade lhe impõem, como também parece sofrer mais com a distância da amada, que se despede dele a cada partida com um lenço branco na mão, tal como as descrições das esposas dos grandes navegadores em nossos livros de história. Para o barqueiro, cada dia é uma jornada, uma “grande navegação” com o barco cheio d’agua. Sua cantiga é mais triste, mas não menos bela e suave.


Trecho de Cantos de Trabalho


A cantiga de pedra, que apresenta homens trabalhando em uma pedreira, cortando, quebrando e carregando grandes rochas, tem uma batida mais forte, tal como o trabalho exige. “Oi companheiro oi, oi levanta a pedra, oi” é entoada por todos os trabalhadores, que se mostram unidos exatamente pelo “companheiro” da letra. Tal amizade é mostrada quando cada um ajuda o outro na tarefa, fazendo-a parecer menos difícil. A pedra carregada por muitos não parece tão pesada. Estes homens também nos são apresentados em planos próximos, tomando uma identidade, se impondo diante uma natureza forte e ríspida. Ao final do dia, guardam-se as ferramentas. O trabalho está feito. A missão do dia terminou.
Em todos os blocos, ou trechos, percebe-se o homem ou a mulher colocados em um lugar de destaque diante a natureza. Aqui, suas ações mudam o ambiente do qual fazem parte. Ainda que gente simples e em trabalhos braçais, tem o poder de recriar. E é exatamente esse brasileiro que Mauro quer mostrar ao Brasil. O homem da terra, trabalhador, forte, determinado. As pessoas constroem o seu lugar. Modificam-no. Unidos pelo trabalho ou sacrificando-se por este, os grandes homens, os verdadeiros brasileiros, constroem seu país. Cantando, como é típico deste povo.

Ficha Técnica
Título: Brasilianas: Cantos de Trabalho
Duração: 10 min
Ano: 1955
Gênero: Documentário
Cor: PB
Direção: Humberto Mauro
Roteiro: José Mauro
Fotografia e Montagem:
José de Almeida Mauro
Arranjo: Maestro Aldo Taranto

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Brasilianas - Engenhos e Usinas (1955)


Talvez dos mais didáticos desta série, este filme narra poeticamente a beleza dos velhos engenhos, movidos pelas corredeiras mansas de riachos, onde novamente homens e natureza fazem parte de um único todo. Ao som de “engenho novo bota a roda pra ‘rodá’”, a alegria do engenho antigo funcionando em consonância com todo o ambiente, onde homens cortam a cana, os carros de boi - outro tema recorrente nesta fase de Mauro - carregam a matéria-prima para que o engenho faça sua parte. Contrasta, por outro lado, com as gélidas e mecânicas usinas, onde o tom industrial soa como desafiadora à ordem e a verdadeira vida do homem brasileiro, ligado à terra, à água, a madeira. O metal não faz parte de tudo isso. Ele não é daqui, deste lugar. A indústria também não. “O engenho parou e, com ele, parou a poesia” diz a narração enquanto o vapor parece tomar o lugar intocável do engenho. Cheio de teias de aranha e triste, o velho moinho não funciona mais. Um final triste para o que estritamente bom. Mas eis que em um renascer, a narração se recupera ao dizer que “mas em muitos pontos eles continuam”. Eles, os velhos engenhos, ganham vida como num repente. A música e a alegria fecham o filme com uma positividade de que ainda há esperança. Ainda há, sobretudo, o Brasil surgindo do campo.


Ficha Técnica Título: Brasilianas: Engenhos e Usinas
Duração: 8 min
Ano: 1955
Gênero: Documentário
Cor: PB
Direção: Humberto Mauro
Fotografia e Montagem: Luiz Mauro
Arranjo: Maestro Aldo Taranto
Interprete: Os Cariocas

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Brasilianas - Aboios e Cantigas (1954)


Continuando a série de análises dos curtas que compõem a série Brasilianas, pode-se destacar, nessa postagem, Aboios e Cantigas. Aqui, a música única e solitária dos filmes anteriores dá espaço primeiramente para o texto silencioso e didático de explicação do que significa a palavra “Aboio”. O tom poético, porém, não é menor. “Aboio é o canto com que o vaqueiro acalma a boiada. É melodia de caráter suave, um som prolongado e macio que tem como que o dom de transformar o bravo em manso...” diz o texto. Ao fundo, os primeiros aboios podem ser ouvidos. O vaqueiro, ao longe, procura o seu gado, aboiando. Os planos próximos evidenciam o elemento principal do filme: o gado. Todos eles, os bois, parecem atentos, ouvindo o vaqueiro chamá-los. O gado se agita – e a música de fundo também – e se põe a seguir o aboio e, aos poucos, vão se juntando até alcançar o caminho de volta ao currau. O boiadeiro continua distante, longe, e o gado o segue. O seu rosto não é importante. Sua voz sim.
Por meio de um costume iminentemente brasileiro, Humberto Mauro mostra que ainda que parta de um todo, o homem está presente, comandando o meio que o cerca. A terra, porém, é a sua mãe e sem ela, ele nem estaria lá. Enquanto o gado vai se acalmando ao passo em que o vaqueiro tem o comando doce, a música se tranqüiliza também. Um novo texto surge, anunciando que o gado está sendo levado para um dos currais para a apartação, ou separação. Lá, o homem se faz presente, impondo-se. Tem rosto e tem o domínio. Seus gestos parecem imperativos e a criança que lá está os imita, demonstrando a continuidade sem fim da tradição da vaquejada.
Aqui, um novo texto antecede as cantigas populares que vão surgindo ao fundo, apresentadas como romances que surgem da tradição da vaquejada. E se Humberto Mauro toma o campo como microcosmo do verdadeiro Brasil, isso fica evidente quando anuncia que “Essas cantigas como as de aboio e apartação constituem das mais belas melodias do folclore brasileiro”.

Ficha Técnica
Título: Brasilianas: Aboios e Cantigas
Duração: 10 min
Ano: 1954
Gênero: Documentário
Cor: PB
Direção: Humberto Mauro
Fotografia e Montagem: José Almeida Mauro
Arranjo: Maestro Aldo Taranto
Interprete: Os Cariocas
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